sexta-feira, 9 de julho de 2010

Os filhotes de gato e as Flores


















Estranhamente ela estava lá novamente, no jardim de sua antiga casa. Suas amigas daquela cidade tão distante, a segunda que havia morado em sua jovem existência, também estavam lá. Brincavam no jardim com filhotes de gato persa. Uma das gatinhas, a mais gorduchinha de todas, era a mais sapeca e tinha uma linda barriga rosada que dava uma vontade loucade apertar. O dia estava lindo, era inverno, mas havia um sol intenso que tomava conta das flores, dos gatos, das amigas, de tudo. Não havia medo, não havia tristeza e tudo parecia brilhar muito. Passaram a tarde no jardim, conversando, brincando com os filhotes, rindo de coisas bobas, fofocando e tudo parecia perfeito, nem mais nem menos...apenas perfeito. Anoiteceu e ela recolheu-se ao seu antigo quarto, que possuía as mesmas cortinas e colchas de borboletinhas rosa de sua infância. Adormeceu tão logo e foi um sono confotável e feliz. Pela manhã tomou café na cozinha com sua família e todos pareciam felizes, como em um comercial de margarina. Depois, ainda de pijama, resolveu voltar ao jardim e para sua surpresa os filhotes todos estavam lá, ainda adormecidos. Alguns dormiam dentro de flores, outros embolados pelo frio dormiam abraçadinhos. Eles estavam por toda parte e eram tão fofos dormindo assim. Voltou para dentro de casa para procurar a máquina fotográfica e antes resolveu mostrar à mãe como estavam lindos os gatos dormindo no jardim. E enquanto admirava aquela beleza boba acordou no escuro e nada mais havia, nem gatos, nem casa, nem mãe e nem flores.

*ilustração de Enia Paulo Lobo

Salve Jorge
















"e me lembro das vacas
que pintei certa vez na aula de arte
e pareciam bem
e pareciam estar melhor que tudo
ali."
(Vacas na Aula de Arte- H. C. Bukowski)


Ele era um homenzinho simples, mas de uma inteligência incrível e quando entrava na sala as meninas ficavam todas em polvorosa, menos Nádia. Nádia o admirava pela sua inteligência e certa elegância, por que ele estava sempre de barba feita, cabelos arrumados e roupas bem alinhadas, bem diferente dos homens que ela costumava reparar. Jorge falava muito bem, sabia muito de tudo e Nádia achava incrível ouví-lo falando de Bauhaus e tantas outras coisas que ela também gostava e que as outras as vezes pareciam nem entender. Tempos depois deparou-se com Francisco, também um ótimo profissional, na sua área, mas falava errado e não entendia muito bem de arte. Francisco não era um homem feio, era bem apessoado, mas quando abria a boca tudo ia por água a baixo. E então Nádia sentia uma estranha saudade do profissionalismo de Jorge, sempre tão preocupado, tão polido, atencioso e adorador de arte. Mas que saudade boba, ela pensou. Um dia serei eu que estarei lá, e ela sabia muito bem do seu potêncial, por que nesse estranho mundo sempre haverá lugar para todos, cada um do seu jeito, com suas limitações mas em perfeita harmonia.



*Ilustração de Lisa Bilvik